Serafim era um garoto de doze anos muito esperto, morava no sobrado muito velho, precisando urgentemente de uma reforma. Tinha amigos, porém tinha uma grande dificuldade ao pronunciar palavras com “pr”, e esse poblema o chateava muito, uma vez que seus colegas riam e zombavam dele. Uma certa noite, ele fez um pedido a Deus: Oh Deus! Permita-me ser o falante mais correto da língua portuguesa, quero poder usar as palavras sem erro algum, quero não ter mais este poblema amanhã.
Deus ouviu suas preces. Ao raiar o outro dia, o menino que tinha poblema passou a ter um grande problema: seu modo de falar ficou muito diferente dos seus colegas. Passaram semanas, e cada dia Serafim passou a ser solitário; seus amigos o abandonaram, porque ele passou a corrigi-los, e a todos os seus colegas. Até a sua professora de português não foi exceção. As pessoas que ouviam suas palavras não o entediam, pela complexidade delas.
O tempo andou com pernas muito longas, a comunidade dele não o agüentava mais, o menino passou a interferir ainda mais em tudo o que se relacionava à língua portuguesa.Os vizinhos, enfurecidos, se reuniram na associação dos moradores, decidindo mandar uma comitiva e impor aos pais de Serafim a entrarem em contanto com um psiquiatra.
Uma multidão enfurecida de curiosos se formou para ver o espetáculo desenrolar. Tinham todo esse furor porque todos já tinham sido corrigidos pelo garoto. Olhavam o percurso que a comitiva fazia, com um prazer sádico — que está inerente ao ser humano —, o desejo e anseio de ver a queda de seu semelhante. Quando a comitiva entrou na casa destes pobres coitados, só se ouvia o brado de vitória desta grande multidão. Este estranho grupo já chegou dando o ultimato, de que amanhã eles tinham que levar seu filho ao psiquiatra; não tinham a menor piedade daqueles pobres pais, suas decisões foram baseadas em ressentimentos. Os pais de Serafim, tristes e abatidos, aceitaram a malfadada proposta.
Serafim, quando soube disso, correu pra seu quarto. Desesperando e chorando pediu a Deus: Oh Senhor!quero ser um problema como antes, quero errar mais do que nunca na língua portuguesa; me livre deste fardo, pois é muito pesado para mim. Não me deixe relegado às trevas densas deste problema. Deus explicou para ele: Não posso atende-lo, pois não mudo, concedi seu pedido porque ouvia teus clamores todo dia. Agora se contente contigo mesmo e aquietes teu coração.Nesse instante, Serafim acordou, e descobriu que tudo passou de um sonho. Ele aprendeu uma grande lição: o erro em excesso é exagero; o certo absoluto é exclusão, pois no mundo de defeitos, o erro também é a perfeição.